Copa Libertadores - Uma dualidade mediática tão "nossa"
- Mauro Salgueiro Delca
- 30 de jan. de 2021
- 3 min de leitura

A final da Copa Libertadores joga-se dentro de umas horas - às 20:00 nacionais, precisamente - e em campo, para disputar o mais prestigiado torneio continental de clubes além da Champions League da UEFA, estarão o Santos e o Palmeiras, de Abel Ferreira. O português comum, não fanático de futebol, ao ouvir a expressão “Copa Libertadores” pensará: «foi aquela taça da América do Sul que o Jorge Jesus ganhou.» Correctamente, aliás.
O problema reside, não aí, mas na não menção à presença de Abel na final de hoje (edição de 2020). Mas é natural que assim seja, porque a exposição mediática em torno da final da Libertadores em nada se compara à euforia que rodeou, não só, a final de Jesus, mas todo o percurso do actual treinador das ‘Águias’ por terras brasileiras.
Em 2019, desde a chegada de Jorge Jesus ao Flamengo, parecia que o Brasileirão, que viria a ser conquistado pelo clube, era o campeonato mais relevante do mundo para nós, a seguir somente ao português. Os golos das partidas do ‘Urubu Vermelho’ passavam nos telejornais do dia seguinte e os jogos mais importantes eram mencionados nas capas dos jornais desportivos. Nada contra da minha parte.
E igualmente, não ponho objecções ao facto de, no dia da final da Copa Libertadores, a capa de um dos nossos desportivos tenha sido inteiramente dedicada a esse mesmo jogo. Noutro, acima do nome e logótipo do próprio jornal, lia-se «Jesus procura história», em referência à dita final. Só um dos três desportivos do nosso país deu o mesmo destaque na capa às duas finais, sendo esse destaque pouco mais que nada: um mero quadradinho no canto inferior direito da capa - curiosamente o jornal sediado na cidade onde nenhum dos dois treinadores finalistas exerceu a profissão.
Ora, ontem disputaram-se jogos referentes aos Quartos de Final da Taça de Portugal. Como tal, creio que se justifica que as primeiras páginas tenham sido compostas por um grande destaque a essa fase da prova rainha do futebol português. Ainda assim, a poucas horas da final, só quem é adepto de futebol está ciente do feito que é Abel Ferreira estar hoje, presente naquela que pode ser a segunda conquista da Libertadores. As pequenas menções ao canto da página não chegam para o feito em questão.
E digo isto falando apenas do que é factual. Se em 2019 já houve quem criticasse a dualidade de mediatismo - problema tipicamente português - atribuído à final e conquista de Jesus em relação às finais e conquistas de Manuel José no Al Ahly (Egipto) e de Pedro Caixinha no Santos Laguna (México) em provas semelhantes, hoje, para mim, o sentimento de injustiça é ainda maior. Porque aqui, oficialmente, trata-se da existência duas medidas para o mesmo peso, já que a competição disputada é a mesma.
Como consideração relevante, noto que seja natural existir maior efusão em torno de uma final sem restrições e com adeptos no estádio e pelas ruas Brasil e Portugal fora. Por sinal, os adeptos do clube com maior representatividade no Brasil - o Flamengo. Compreendo ainda que o percurso de Jorge Jesus tenha correspondido, não por acaso, à melhor época do clube desde os anos 80 e, por isso, deva ser celebrado e noticiado, mesmo da forma que foi.
Porém, a competição em questão continua a ser a mesma. E se tivermos de entrar por reflexões, convém refletirmos sobre a diferença de qualidade geral entre o plantel do Flamengo de Jorge Jesus e o do Palmeiras de Abel Ferreira. No primeiro caso, falamos de uma equipa com um orçamento que nunca se tinha visto no Brasil, com jogadores no pico da carreira que podiam jogar nos melhores campeonatos da Europa. O mérito de JJ não é, de todo, retirável. Ainda assim, no segundo caso, falamos de uma equipa que não está, diria, no lote das três equipas com melhor valor individual do Brasil. Falamos de uma equipa com o cunho de Abel, mas que nem é a melhor da sua carreira. Não a considero mais recheada que o seu Sporting de Braga das épocas 2017/18 e 2018/19.
Se hoje Abel conquistar, efectivamente, a Copa Libertadores, e fazemos todos votos para que tal aconteça, esperemos por amanhã para ver como será o tratamento mediático dado à eventual conquista. Até agora, não há dúvida alguma de que Abel Ferreira tem sido fortemente injustiçado pelo panorama mediático da sua própria pátria.
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